Os planos da nova área de gestão de ativos imobiliários do UBS

Confira entrevista completa com Moise Politi, à frente dessa divisão, recém-estabelecida no Brasil.

6 de setembro de 2017Mercado Imobiliário
Moise Politi ficou conhecido por cofundar, no final da década de 1990, a Brazilian Finance & Real Estate (BFRE), que estabeleceu pioneiramente no Brasil uma plataforma one stop shop de serviços financeiros imobiliários. Depois da venda bilionária ao Grupo PAN quase 15 anos mais tarde e de um período atuando como executivo junto aos novos donos do negócio, poderia ter optado por uma aposentadoria precoce, e até tentou. Viajou, jogou tênis, mas "foi chegando uma hora em que não tinha mais graça", diz.

Decidiu, então, voltar ao mercado a convite do UBS para trabalhar na criação e na operação de uma área do banco focada em gestão de ativos imobiliários no País. Para falar desse desafio, de oportunidades no setor imobiliário que tem observado e de episódios marcantes da sua biografia, Moise recebeu a GRI Magazine na sede do UBS em São Paulo. Em meio à sua rotina agitada, que tem espaço também para filantropia, ioga, surfe e até baladas, ele concedeu uma entrevista bem-humorada e otimista, regada a diversas histórias de bastidores. Confira os principais trechos:

GRI Magazine: Desde o final de 2015, você está engajado no desenho e na implementação de uma área do UBS focada em gestão de ativos imobiliários no Brasil. Como tem sido esse esforço?

Moise Politi
: Nosso viés são investimentos imobiliários para investidores estrangeiros e brasileiros, bem como assessorar os clientes do banco nos investimentos imobiliários que possuem. Primeiro, fiz um trabalho de consultoria para identificar o que seria mais adequado em termos de estrutura, produtos e clientela. Levou um ano para preparar tudo isso. Aí, contratamos um time e hoje estamos full power.

Que balanço faz da operação até aqui?

Vejo a jornada como extremamente positiva. Conseguimos montar uma equipe ótima [Moise trouxe consigo, em regime de dedicação exclusiva desde outubro de 2016, os profissionais da Real Estate Capital (REC), oriundos da BFRE] e ter um business plan fabuloso, aprovado por um banco internacional que possui 70 mil funcionários e US$ 2,8 trilhões de ativos. Contamos com um pipeline grande de negócios e, no momento em que esta edição da revista estiver sendo distribuída, devemos estar com um fundo novo captado, fora as carteiras que já gerenciamos, objeto de sigilo bancário.

Para que tipo de oportunidade o UBS vem olhando?

Estamos focando três frentes no País: escritórios com renda, CRIs [Certificados de Recebíveis Imobiliários] tanto comerciais quanto residenciais e operações estruturadas para portfólio de residencial pronto com habite-se. Ainda não nos voltamos a outras possibilidades, como hotéis, shoppings e logística. Priorizamos o que consideramos mais imediato com relação a oportunidade versus interesse de investidores. No que toca a regiões, temos nos concentrado, inicialmente, em São Paulo e Rio.

Em uma das discussões do GRI Escritórios 2017, em abril, você chamou a atenção para uma grande quantidade de salinhas comerciais disponíveis atualmente a preços baixos que poderiam representar ótimas chances de compra. O que exatamente imagina para elas?

Passei por uma experiência semelhante em 2007/2008 com os flats, cujos preços se encontravam 50% abaixo do valor de reposição por conta de excesso de construção e oferta. Na ocasião, eu estava na BFRE e montamos o Maxinvest, um fundo imobiliário que alcançou excelente performance, centrado em dois objetivos: adquirir flats e permitir que proprietários desse tipo de imóvel capitalizassem o fundo para ter maior diversificação e menor risco. O conceito foi extremamente bem aceito e 650 flats foram capitalizados. O fundo começou com R$ 70 milhões e o market value chegou a quase R$ 300 milhões. A estratégia era comprar, vender e obter ganho de capital.

Seria viável replicar esse modelo agora com as saletas?

Com as salinhas comerciais, aconteceu a mesma coisa. Todo mundo se empolgou, construiu e há um acúmulo delas – vendidas ou em estoque – vazias. O desafio é dar a elas outro uso, uma vez que existem muitas que podem ser adquiridas por menos de 50% do valor de reposição. Aquele que conseguir fazer isso terá o benefício da arbitragem. Pense numa hipótese absurda: comprar salas comerciais e transformá-las em pequenos apartamentos, se possível. Isso elevaria o preço de R$ 2 mil/m2 para R$ 8 mil/m2, dependendo da região. O desafio é achar as salas, adquiri-las e aprovar a mudança do uso junto à prefeitura. Há aí uma oportunidade gigantesca.

Isso é algo que vocês estão buscando fazer no banco?

Estamos olhando, mas não temos a expertise necessária para promover a transformação. Nosso viés é muito mais financista.

O UBS é um dos maiores gestores de ativos imobiliários do mundo. Que peso o Brasil deve vir a ocupar no resultado global da instituição, com a nova área em funcionamento?

O banco tem US$ 80 bilhões em fundos imobiliários no mundo. O Brasil ainda representa muito pouco porque nossa área é uma startup; porém, a meta é chegar a US$ 5 bilhões no País em cinco anos.

Como analisa o momento brasileiro atual e, especificamente, a realidade do setor de real estate?

A economia em si vem andando, não sofreu mudanças drásticas. Vemos um viés de inflação baixa e juros declinantes. Todo o aspecto econômico está no rumo certo. Obviamente, com a postergação das reformas, acaba ocorrendo um adiamento da expectativa e da recuperação. A direção, todavia, está dada. Há que se ter em mente que, no caso de investimento de base imobiliária, para conquistar sucesso daqui a dez anos, é necessário iniciar agora. Não dá para ficar parado esperando.

De que forma o cenário nacional transparece nas suas conversas com os investidores, sobretudo os estrangeiros?

Muitos investidores estrangeiros ficaram reticentes, obviamente, ao ver toda essa instabilidade política. Nosso discurso é de que existe um caminho que está sendo trilhado e de que o País vai chegar lá. Não temos dúvida com relação a isso. Nossa visão de Brasil é para dez a 20 anos, não seis meses. O que digo aos investidores é que, se querem colocar recursos no Brasil, podem fazê-lo com tranquilidade, independentemente desses acidentes de percurso. O que precisam decidir é o grau de risco a correr. Se desejam um retorno maior, que entrem hoje. Se são mais conservadores, que esperem seis meses. Sou muito confiante. Acho que vai dar certo.

Os investidores têm compartilhado desse raciocínio?

Alguns sim, outros não. Mas a maior parte dos investidores internacionais concorda com esse approach. Não ocorreu ainda nenhuma conversa em que dissessem que o Brasil vai 'explodir'. Todos creem que é uma questão de timing.

Sua ida para o UBS marca uma nova etapa numa carreira que começou no mercado financeiro e enveredou pelo setor imobiliário desde os anos 1990, quando você se tornou um dos fundadores da BFRE. Por que, lá atrás, resolveu dar essa guinada?

Logo depois de me formar engenheiro civil, fui trabalhar no Chase Manhattan Bank, no Brasil e nos Estados Unidos. Portanto, ingressei no mercado financeiro já na largada e assim permaneci por anos. Passado algum tempo, me tornei sócio do Banco Ourinvest e, nessa época, precisamente em 1997, tive a ideia de entrar no ramo de serviços financeiros ao setor imobiliário. Minha intenção era fazer a ponte entre o mercado de capitais e financeiro e o mercado imobiliário, pois eles não se falavam.

Você já tinha contato com empresários de real estate naquela fase?

Eu conversava muito com Meyer Nigri [Tecnisa] e Elie Horn [Cyrela]. A ideia veio a partir de um convite que Elie Horn me fez para participar de um evento. Ele próprio não foi, mas eu, sim, e, naquela hora, diante de 2 mil profissionais presentes, me dei conta de que existia todo um setor mal atendido pelo mercado financeiro. Já havia a legislação de fundos imobiliários, de securitização e de alienação fiduciária. O framework legal estava lá, sem que, contudo, fosse explorado. No dia seguinte, apresentei aos meus sócios na Ourinvest a intenção de atuar nesse ramo. Comecei o trabalho nesse sentido em setembro de 1997.

De que maneira se deu a aproximação com Fabio Nogueira, conhecido por ter comandado as áreas de Crédito Imobiliário e Poupança de instituições como o BankBoston e que viria a ser seu sócio na BFRE?

Falei com um amigo, Gilson Schwartz, que era economista do Banco de Boston [mais tarde convertido em BankBoston] e assessorava Henrique Meirelles [então presidente mundial da instituição]. Ele me recomendou conhecer Fabio e promoveu um almoço entre nós. Contei a ele a ideia e propus montarmos uma empresa juntos. Eu não entendia nada daquilo, ao passo que ele era o maior especialista do País. Fabio aceitou e fundamos a Brazilian Mortgages, depois a Brazilian Securities, a Brazilian Capital e a BM Sua Casa [compondo a holding BFRE].

Quais foram as etapas mais marcantes da sua atuação nesse negócio?

Iniciamos com dois funcionários, Fabio e eu, e R$ 2 milhões de capital. Em 1999, após já termos despendido todo o capital, criamos o fundo imobiliário do Shopping Pátio Higienópolis, que foi o primeiro do País voltado a investidores de varejo. Eram R$ 40 milhões, correspondendo a 25% do empreendimento. Foi um sucesso e um turning point para nós. Na sequência, fizemos vários outros fundos e a companhia foi crescendo. Tínhamos dois desafios enormes, que demandavam um trabalho muito intenso: gerenciar a empresa e contribuir para o desenvolvimento da indústria.

A BFRE teve parceiros de peso, como a Caisse de Dépôt et Placement du Québec (CDPQ), o fundo TPG-Axon e a Equity International, de Sam Zell. Como aconteceu a chegada deles?

Em 2001, conhecemos o pessoal da CDPQ [a subsidiária de real estate que viria a se chamar Ivanhoé Cambridge] e negociamos sua entrada. Concretizá-la exigiu um grande esforço, pois éramos uma instituição financeira e havia necessidade de um decreto presidencial para autorizar a participação de um estrangeiro. Demorou mais de um ano até que corresse todo o processo. Arcamos com o ônus do pioneirismo nessa e em outras situações. Também em 2001, estivemos com Sam Zell, que tinha muito interesse em vir para o Brasil, mas dizia que o mercado ainda não tinha liquidez suficiente. Foi em 2009 que a Equity International ingressou na nossa plataforma, com uma fatia de 20%. Já o TPG-Axon se juntou a nós em 2006. Fizemos um private placement para captação de recursos.

O que esses parceiros agregaram ao negócio, além do capital?

Nosso pioneirismo, na realidade, foi local. Tudo o que realizamos foi inspirado nos Estados Unidos e, ao trabalhar de maneira diligente e profissional, conseguimos atrair muitos investidores estrangeiros. Com Sam Zell, por exemplo, aprendemos muito sobre a questão de timing. Ele compra e vende na hora certa. É impressionante. Tem uma capacidade de análise muito forte, entende de economia, finanças, movimento de massas e psicologia do investidor. Tivemos interações bastante boas igualmente com o TPG-Axon, que nos ajudou na definição de como estruturar nossos fundos.

Por que a decisão, na virada de 2011 para 2012, de vender a BFRE para o Grupo PAN, detido por BTG Pactual e Caixa Econômica Federal?

Somávamos 850 funcionários, um capital de R$ 800 milhões, R$ 14 bilhões de fundos imobiliários sob administração e R$ 9 bilhões em securitização. Éramos os maiores do mercado. A venda se concretizou por R$ 1,250 bilhão. Assinamos o memorando de entendimento em 2011 e a negociação com o BTG foi muito rápida e fácil. Já para acertar a documentação viramos várias noites porque o business tinha muitas vertentes e isso tornou o processo complexo. A opção pela venda foi baseada em duas linhas de raciocínio. Uma delas foi dar a oportunidade de a empresa crescer bem mais porque tínhamos uma limitação de capital. A outra foi o timing, considerando que estávamos no pico de um ciclo. Apareceu uma proposta, o momento e o preço eram bons. Eu, pessoalmente, não tenho apego a nada. Tudo é mercadoria. Muitas pessoas se veem em meio a ciclos maravilhosos, mas ficam apegadas e não vendem; aí, depois, chega um ciclo ruim. Nós, não.

Passados cerca de cinco anos da transação, o que, na sua avaliação, os novos donos de fato trouxeram de positivo e de negativo para a BFRE? A venda valeu a pena para todos os envolvidos?

Tínhamos uma operação sinérgica, com integração vertical. Éramos, para o mercado imobiliário financeiro, um one stop shop. Contudo, quando foi efetivada a venda, como havia um banco de investimento e um banco comercial – BTG e PAN –, promoveu-se uma divisão da empresa em dois blocos. Com isso, perdeu-se um pouco da sinergia. Ao observar o mercado, percebo que, até hoje, ninguém replicou o que praticávamos. Acredito que, se alguém iniciar agora um business que vá desde a originação até o asset, conseguirá ter muito sucesso, pois não existe nenhum outro semelhante. No entanto, não serei eu a fazer isso. Já estou cansado.

Com a venda da holding, você passou a ser executivo do BTG. Foi complicado encarar essa posição, depois de tanto tempo como dono?

Não sofri muito porque sou bastante flexível. Eu me adaptei bem à estrutura do BTG. Na posição de associate partner, perdi poder decisório; porém, tinha poder de sugestão, assessoria, consulta. A experiência de participar de um grupo dinâmico como o BTG, com profissionais muito bons, uma cultura espetacular, um modelo de partnership, meritocracia e 'ditadura do argumento', foi enriquecedora. Terminei meu ciclo de três anos lá em maio de 2015. Então, fiquei seis meses num período de non compete e, passado esse tempo, senti que ainda podia contribuir com o mercado. Por isso, estou agora no UBS.

Entrevista concedida à editora-chefe, Giovanna Carnio