Ministério dos Transportes realiza roadshow para membros do GRI Institute em SP

Encontro teve como foco a carteira de projetos de concessões rodoviárias

29 de julho de 2025Infraestrutura
Por Henrique Cisman

As concessões de rodovias brasileiras vêm amadurecendo ao longo do tempo, e o momento é de busca por inovações que garantam, cada vez mais, a sustentabilidade e a atratividade dos projetos em um cenário de crescentes desafios. Com este pano de fundo, o GRI Institute reuniu lideranças do Ministério dos Transportes e tomadores de decisão do setor privado, em São Paulo, para um roadshow seguido de perguntas e respostas. 

O encontro contou com as presenças de George Santoro, secretário executivo do Ministério dos Transportes (na ocasião, também ministro em exercício), e Viviane Esse, secretária nacional de Transportes Rodoviários, além de nomes como Marco Aurélio Barcelos, presidente da ABCR, e Guilherme Sampaio, presidente da ANTT, bem como representantes do Banco Mundial, da IFC, do BNDES e do TCU. 

Confira a seguir os destaques.  

Tecnologia e o desafio do free flow

A implementação do sistema free flow, que permite a cobrança eletrônica de pedágio sem paradas, foi um dos destaques. Se há poucos anos o sistema era visto com ceticismo, especialmente em relação ao risco de evasão e inadimplência devido à informalidade da frota brasileira, tais receios estão sendo superados, segundo os participantes.

O desafio atual reside na capacidade de especificar as obrigações, responsabilidades e alocação de riscos para escalar o número de transações. O BNDES tem triplicado a relação entre pontos de coleta de dados a cada 100 quilômetros para um estudo de tráfego mais preciso.

A alocação do risco de inadimplência tem sido majoritariamente pública (90% versus 10% do setor privado). Ainda assim, a concessionária desempenha um papel crucial na comunicação e conscientização do usuário sobre o free flow, justificando a manutenção de uma "skin in the game" privada. Quanto ao risco de fraude por meio de adulteração de placa do veículo, uso de placas clonadas ou outras manobras para evitar o pagamento da tarifa, a discussão conceitual aponta para a alocação do risco no setor público, dado o baixo percentual de ocorrências na prática.

A regulação do free flow é percebida como um sistema em camadas. Elementos de previsibilidade e alocação de riscos estão na regulação contratual. Já a definição de meios de pagamento incentivados - que evoluem rapidamente - pode ficar em regulação setorial, fora do contrato. Medidas estruturantes, como a notificação de tarifas na Carteira Digital de Trânsito (CDT), também são cruciais para o ambiente de negócios.


Aprimoramento das modelagens e atratividade dos projetos

No roadshow, foi dado destaque para a importância dos estudos de viabilidade, cujas maturidades são tão relevantes quanto as inovações contratuais. De uma carteira de aproximadamente 30 projetos estruturados pela Infra S.A., sete leilões já foram realizados. 

Um objetivo central é antecipar as particularidades de cada projeto para evitar problemas contratuais futuros, garantindo que a gestão do contrato se adeque às mudanças e inovações. Um exemplo é a Nova Dutra, em que a flexibilidade contratual permitiu à concessionária criar uma faixa adicional em alguns trechos para ampliar a capacidade e melhorar o fluxo de tráfego.

Atualmente, o Brasil tem o maior programa de concessões rodoviárias da América Latina - e talvez do mundo -, fruto de um trabalho de padronização dos contratos que facilita a absorção pelos investidores. A IFC, por exemplo, apoia uma dezena de projetos de concessão rodoviária no país, incluindo os lotes 4 e 5 do Paraná, cujos leilões estão previstos para os dias 23 e 30 de outubro, respectivamente.

A agenda ESG e a atração de investimentos

A sustentabilidade é uma preocupação crescente. Segundo o BID, a preocupação com a resiliência da infraestrutura no Brasil é um exemplo para outros países da América Latina. Dos mais de 40 projetos em carteira no Banco Interamericano de Desenvolvimento, cerca de metade está no Brasil.
O atendimento a padrões de sustentabilidade previstos por instituições financeiras multilaterais atrai investidores estrangeiros e nacionais e reduz o risco de crédito, tornando o ambiente mais competitivo e propício ao investimento.

Benefícios sociais também estão em pauta. Alguns participantes defendem a retomada da obrigatoriedade da instalação de fibra ótica pelas concessionárias para uso do Estado, o que traria um grande benefício para regiões sem acesso à internet. A conectividade também pode aumentar a segurança viária, permitindo a localização de veículos em caso de pane ou acidente, e ampliando os serviços de socorro mecânico. O DNIT já estabeleceu regras para a ocupação das faixas de domínio em rodovias federais.

Rodovias que já avançaram em conectividade têm demonstrado bons resultados, com uma redução média de 22% em acidentes e 20% em mortes no programa de concessão federal, conforme números mencionados na reunião. O custo da conectividade e da segurança é considerado marginal em relação aos benefícios, que incluem a possibilidade de o usuário fiscalizar ativamente a rodovia. 

"Estamos vivendo uma 'revolução tecnológica' nas rodovias, que transformará a relação com o usuário, o mercado segurador e até as forças de segurança, promovendo maior controle e eficiência", assinala um executivo.  

Desafios orçamentários e autonomia das agências

Um dos pontos mais sensíveis do debate foi o corte de 25% no orçamento das agências reguladoras, incluindo a ANTT. O ministro em exercício, George Santoro, reconhece o desafio, mencionando que o Ministério dos Transportes está buscando repor parte desses recursos - cerca de R$30 milhões para a ANTT. No entanto, a situação fiscal do governo e a possibilidade de novos bloqueios orçamentários representam uma ameaça.

A ABCR fez um apelo para que o TCU ajude a encontrar soluções para a sustentação financeira das agências. A "taxa de fiscalização" (TFF) paga pelos usuários, embora mal denominada, deveria ser integralmente destinada à manutenção da agência, garantindo previsibilidade e capacidade contínua de fiscalização.

Outro ponto de preocupação é a medida provisória 1.303/2025, que alterou a tributação das debêntures incentivadas, tornando-as "desincentivadas", segundo executivos presentes. "Essa medida desestimula o financiamento privado e pode sobrecarregar o BNDES, frustrando a arrecadação e 'matando a galinha dos ovos de ouro' de um setor que gerou bilhões de reais em investimentos para o país", assinala um participante.

Apesar dos desafios, há um reconhecimento unânime sobre o momento privilegiado do setor de concessões rodoviárias no Brasil. A articulação entre Ministério dos Transportes, ANTT, Infra S.A. e TCU, com o apoio do setor, tem permitido a realização de um número histórico de projetos com alta qualidade, transformando a infraestrutura do país.