
ANTT destaca avanços contratuais em rodovias e foco no modal ferroviário
GRI Institute reuniu membros que investem e operam em ambos os setores com o presidente da agência, Guilherme Sampaio
29 de julho de 2025Infraestrutura
Por Henrique Cisman
O setor de transportes terrestres brasileiro atravessa uma fase de evolução regulatória, com a ANTT conduzindo um amplo processo de modernização e consolidação de suas diretrizes. A agência tem discutido temas estratégicos como a reformulação do sistema de fiscalização de pesagem em movimento nas rodovias e a operacionalização do inovador Marco Legal das Ferrovias.
Paralelamente, um dos desafios mais complexos enfrentados pela autarquia consiste na elaboração de critérios equilibrados para prorrogações antecipadas de contratos ferroviários, buscando harmonizar a necessária atratividade para novos investimentos com a salvaguarda efetiva do interesse público.
Para debater esses e outros tópicos que interessam a investidores e operadores de concessões de transportes no Brasil, o GRI Institute se reuniu com Guilherme Sampaio, presidente da ANTT. A conversa foi conduzida por Roberto Lambauer, sócio do KLA Advogados, e ainda contou com as participações especiais de Rafael Furtado (VLI), Renato Bortoletti (Nova Infra Invest) e Ricardo Sanches (ACCIONA), dentre outros membros.
Segundo os participantes, isso significa taxas internas de retorno compatíveis com o risco - variando de 11,5% a 14% - e deságios realistas, limitados a cerca de 18% para evitar a necessidade de aportes governamentais.
A agência evoluiu para uma matriz de risco mais equitativa, compartilhando praticamente todos os riscos com o poder concedente, exceto o financiamento. Isso inclui riscos geológicos, geotécnicos e de demanda, inclusive com maior compartilhamento para projetos com demanda incerta. As variações cambial e de insumos também são mecanismos acionáveis.
Vale destacar que a ANTT foi pioneira no reequilíbrio de contratos de concessão rodoviária em relação à demanda, aprovando uma metodologia durante a pandemia. Foram criados institutos de reequilíbrio cautelar e preventivo para agilizar a adaptação dos contratos a novas realidades.
A agência tem atuado proativamente na resolução de contratos da terceira etapa que não performaram, como o caso da BR-163 no Mato Grosso, através de trocas de controle acionário e renegociações que visam antecipar investimentos e reduzir tarifas. Concessionárias que não cumpriram as obrigações previstas tiveram seus contratos repactuados ou encerrados.
Em outra frente de evolução, a agência implementou o Regulamento de Concessões Rodoviárias (RCR), unificando normativos para facilitar a gestão do investidor e reduzir a assimetria de informações. Houve uma mudança de comando e controle para regulação por incentivo, premiando concessionárias que antecipam investimentos ou superam metas com incrementos tarifários.
Com o aumento da malha concedida, a ANTT busca implementar tecnologia para gestão de contratos, fiscalização e melhoria da experiência do usuário. A implementação do weight-in-motion (pesagem em movimento), que reduz filas e consumo de combustível, e as câmeras de detecção automática de incidentes, são exemplos. A conectividade em todas as rodovias federais até o próximo ano é uma meta ambiciosa, com planos de 100 dias para novas concessões.
O mercado está aquecido, com 12 leilões exitosos realizados nos últimos anos, atraindo mais de quatro competidores em algumas disputas e com a participação de 10 players diferentes nos certames, demonstrando a diversidade de projetos e o interesse dos investidores.
A agenda ESG também está na pauta: ANTT e Ministério dos Transportes estão integrando metas ambientais, sociais e de governança nas concessões. Um percentual mínimo da receita bruta (1%) deverá ser destinado ao desenvolvimento de tecnologias e infraestruturas resilientes.
A agência alinhou seu planejamento estratégico à Agenda 2030 e aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU a fim de promover eficiência energética, descarbonização e financiamentos verdes - emissões recentes de "green bonds" são apontadas como exemplo de sucesso.
A conectividade ainda é um desafio em áreas com menor fluxo, e a interoperabilidade entre os sistemas é fundamental. A ANTT, em conjunto com a Anatel, busca soluções para municípios e regiões atualmente desconectadas.
No campo dos desafios, o mercado pede um olhar especial para projetos mais complexos, como o Túnel Santos-Guarujá, que exigem maior flexibilização regulatória devido a particularidades fundiárias, ambientais e de CAPEX.
A reforma tributária e a Medida Provisória 1.303/2025 - que alterou a tributação de debêntures incentivadas - geram incerteza e impactam a financiabilidade dos contratos de concessão, minando a segurança jurídica.
A interface da ANTT com estados e municípios ainda é um desafio constante, especialmente em projetos que envolvem diferentes esferas de governo.
A ANTT planeja unificar a regulação ferroviária, criando um modelo semelhante ao RCR das rodovias. Isso inclui matriz de risco, interoperabilidade, capacidade ociosa e a relação de bens. Apesar do monopólio natural, a ANTT pretende ter um olhar mais específico para o usuário de ferrovias.
A renovação antecipada da FCA é um marco importante, e o avanço das autorizações ferroviárias - como as da Eldorado Brasil Celulose (ramal ferroviário entre Três Lagoas e Aparecida do Taboado) e da Suzano (novos trechos ferroviários no Mato Grosso do Sul - demonstra o interesse em novos projetos. A possibilidade de leilão da EF-118 com aporte público é vista como um avanço.
A ANTT também busca integrar seus sistemas com os centros de controle das ferrovias para ter maior controle e visibilidade da operação, visando eliminar a "ociosidade" e garantir a utilização da infraestrutura.
Mudanças normativas, embora necessárias, geram insegurança em contratos de longo prazo (25 a 30 anos), e a agência precisa atuar para adaptar os contratos ao longo do tempo.
Outro desafio é a flexibilidade do ATF (Agente de Transporte Ferroviário) e a prioridade do concessionário no chamamento, que não estão adequadamente tratados, gerando preocupação com a saúde financeira dos contratos de quem investiu na infraestrutura. A extinção dos contratos ao final do prazo de concessão preocupa os investidores, que buscam segurança no retorno de seu investimento.
Há uma percepção de que os principais gargalos para o transporte ferroviário não são a ociosidade, mas sim os acessos portuários. A falta de integração entre os planos de logística e a estruturação de projetos portuários e ferroviários impede a fluidez da carga, segundo alguns executivos presentes.
Outro gargalo é a falta de um sistema de sinalização ferroviária único no Brasil, com diferentes sistemas por concessionária, que desincentiva o tráfego de terceiros e exige investimentos significativos. O intercâmbio de material rodante também é um desafio.
Potenciais investidores e operadores ferroviários apontam para a necessidade de o governo proteger a demanda, entendendo que os projetos são mais suscetíveis a fatores exógenos e a mudanças na legislação.
A renovação dos contratos gera pressão na cadeia de fornecedores de vagões e locomotivas, podendo causar atrasos e aumento de custos, que não estão bem tratados nos contratos.
Para o Project Finance ferroviário, busca-se replicar as garantias das rodovias, como contas vinculadas e taxas internas de retorno mais elevadas (em torno de 15%), além da possibilidade de aporte público (não do Orçamento Geral da União) para projetos como EF-118 e Fico-Fiol.
A agência contratou R$ 140 bilhões em investimentos privados nos últimos 12 anos, demonstrando a capacidade de impulsionar o desenvolvimento do setor. O debate destacou a importância de discutir a autonomia e independência financeira das agências reguladoras para garantir a continuidade dos projetos de infraestrutura e evitar a dependência do Orçamento Geral da União.
O setor, através de suas associações, tem apoiado a necessidade de fortalecer a regulação, com o uso dos recursos da agência para investimentos em modernização e treinamentos de capacitação para os técnicos da agência. A redução de pessoal e os cortes orçamentários impactam a performance, exigindo um esforço coletivo para manter a solidariedade econômica e financeira.
O setor de transportes terrestres brasileiro atravessa uma fase de evolução regulatória, com a ANTT conduzindo um amplo processo de modernização e consolidação de suas diretrizes. A agência tem discutido temas estratégicos como a reformulação do sistema de fiscalização de pesagem em movimento nas rodovias e a operacionalização do inovador Marco Legal das Ferrovias.
Paralelamente, um dos desafios mais complexos enfrentados pela autarquia consiste na elaboração de critérios equilibrados para prorrogações antecipadas de contratos ferroviários, buscando harmonizar a necessária atratividade para novos investimentos com a salvaguarda efetiva do interesse público.
Para debater esses e outros tópicos que interessam a investidores e operadores de concessões de transportes no Brasil, o GRI Institute se reuniu com Guilherme Sampaio, presidente da ANTT. A conversa foi conduzida por Roberto Lambauer, sócio do KLA Advogados, e ainda contou com as participações especiais de Rafael Furtado (VLI), Renato Bortoletti (Nova Infra Invest) e Ricardo Sanches (ACCIONA), dentre outros membros.
Rodovias: Evolução contratual e tecnológica
A ANTT tem se dedicado a aprimorar a segurança jurídica e atrair investimentos de longo prazo para o setor rodoviário. Guilherme Sampaio ressalta a evolução dos modelos de concessão até chegar à etapa atual, que prioriza a sustentabilidade econômica e financeira dos projetos.Segundo os participantes, isso significa taxas internas de retorno compatíveis com o risco - variando de 11,5% a 14% - e deságios realistas, limitados a cerca de 18% para evitar a necessidade de aportes governamentais.
A agência evoluiu para uma matriz de risco mais equitativa, compartilhando praticamente todos os riscos com o poder concedente, exceto o financiamento. Isso inclui riscos geológicos, geotécnicos e de demanda, inclusive com maior compartilhamento para projetos com demanda incerta. As variações cambial e de insumos também são mecanismos acionáveis.
Vale destacar que a ANTT foi pioneira no reequilíbrio de contratos de concessão rodoviária em relação à demanda, aprovando uma metodologia durante a pandemia. Foram criados institutos de reequilíbrio cautelar e preventivo para agilizar a adaptação dos contratos a novas realidades.
A agência tem atuado proativamente na resolução de contratos da terceira etapa que não performaram, como o caso da BR-163 no Mato Grosso, através de trocas de controle acionário e renegociações que visam antecipar investimentos e reduzir tarifas. Concessionárias que não cumpriram as obrigações previstas tiveram seus contratos repactuados ou encerrados.
Em outra frente de evolução, a agência implementou o Regulamento de Concessões Rodoviárias (RCR), unificando normativos para facilitar a gestão do investidor e reduzir a assimetria de informações. Houve uma mudança de comando e controle para regulação por incentivo, premiando concessionárias que antecipam investimentos ou superam metas com incrementos tarifários.
Com o aumento da malha concedida, a ANTT busca implementar tecnologia para gestão de contratos, fiscalização e melhoria da experiência do usuário. A implementação do weight-in-motion (pesagem em movimento), que reduz filas e consumo de combustível, e as câmeras de detecção automática de incidentes, são exemplos. A conectividade em todas as rodovias federais até o próximo ano é uma meta ambiciosa, com planos de 100 dias para novas concessões.
O mercado está aquecido, com 12 leilões exitosos realizados nos últimos anos, atraindo mais de quatro competidores em algumas disputas e com a participação de 10 players diferentes nos certames, demonstrando a diversidade de projetos e o interesse dos investidores.
A agenda ESG também está na pauta: ANTT e Ministério dos Transportes estão integrando metas ambientais, sociais e de governança nas concessões. Um percentual mínimo da receita bruta (1%) deverá ser destinado ao desenvolvimento de tecnologias e infraestruturas resilientes.
A agência alinhou seu planejamento estratégico à Agenda 2030 e aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU a fim de promover eficiência energética, descarbonização e financiamentos verdes - emissões recentes de "green bonds" são apontadas como exemplo de sucesso.
A conectividade ainda é um desafio em áreas com menor fluxo, e a interoperabilidade entre os sistemas é fundamental. A ANTT, em conjunto com a Anatel, busca soluções para municípios e regiões atualmente desconectadas.
No campo dos desafios, o mercado pede um olhar especial para projetos mais complexos, como o Túnel Santos-Guarujá, que exigem maior flexibilização regulatória devido a particularidades fundiárias, ambientais e de CAPEX.
A reforma tributária e a Medida Provisória 1.303/2025 - que alterou a tributação de debêntures incentivadas - geram incerteza e impactam a financiabilidade dos contratos de concessão, minando a segurança jurídica.
A interface da ANTT com estados e municípios ainda é um desafio constante, especialmente em projetos que envolvem diferentes esferas de governo.
Ferrovias: Desafios regulatórios e de financiamento
O setor ferroviário, apesar do novo marco legal, enfrenta desafios regulatórios complexos e a necessidade de replicar o sucesso das rodovias em termos de modernização e atração de investimentos.A ANTT planeja unificar a regulação ferroviária, criando um modelo semelhante ao RCR das rodovias. Isso inclui matriz de risco, interoperabilidade, capacidade ociosa e a relação de bens. Apesar do monopólio natural, a ANTT pretende ter um olhar mais específico para o usuário de ferrovias.
A renovação antecipada da FCA é um marco importante, e o avanço das autorizações ferroviárias - como as da Eldorado Brasil Celulose (ramal ferroviário entre Três Lagoas e Aparecida do Taboado) e da Suzano (novos trechos ferroviários no Mato Grosso do Sul - demonstra o interesse em novos projetos. A possibilidade de leilão da EF-118 com aporte público é vista como um avanço.
A ANTT também busca integrar seus sistemas com os centros de controle das ferrovias para ter maior controle e visibilidade da operação, visando eliminar a "ociosidade" e garantir a utilização da infraestrutura.
Mudanças normativas, embora necessárias, geram insegurança em contratos de longo prazo (25 a 30 anos), e a agência precisa atuar para adaptar os contratos ao longo do tempo.
Outro desafio é a flexibilidade do ATF (Agente de Transporte Ferroviário) e a prioridade do concessionário no chamamento, que não estão adequadamente tratados, gerando preocupação com a saúde financeira dos contratos de quem investiu na infraestrutura. A extinção dos contratos ao final do prazo de concessão preocupa os investidores, que buscam segurança no retorno de seu investimento.
Há uma percepção de que os principais gargalos para o transporte ferroviário não são a ociosidade, mas sim os acessos portuários. A falta de integração entre os planos de logística e a estruturação de projetos portuários e ferroviários impede a fluidez da carga, segundo alguns executivos presentes.
Outro gargalo é a falta de um sistema de sinalização ferroviária único no Brasil, com diferentes sistemas por concessionária, que desincentiva o tráfego de terceiros e exige investimentos significativos. O intercâmbio de material rodante também é um desafio.
Potenciais investidores e operadores ferroviários apontam para a necessidade de o governo proteger a demanda, entendendo que os projetos são mais suscetíveis a fatores exógenos e a mudanças na legislação.
A renovação dos contratos gera pressão na cadeia de fornecedores de vagões e locomotivas, podendo causar atrasos e aumento de custos, que não estão bem tratados nos contratos.
Para o Project Finance ferroviário, busca-se replicar as garantias das rodovias, como contas vinculadas e taxas internas de retorno mais elevadas (em torno de 15%), além da possibilidade de aporte público (não do Orçamento Geral da União) para projetos como EF-118 e Fico-Fiol.
Gestão orçamentária e autonomia da ANTT
A ANTT, apesar de ter tido uma redução orçamentária significativa (aproximadamente 40% a 50% em termos reais nos últimos anos), tem demonstrado resiliência e eficiência na gestão. A agência é superavitária, arrecadando 400% mais do que o seu orçamento por meio de taxas e multas.A agência contratou R$ 140 bilhões em investimentos privados nos últimos 12 anos, demonstrando a capacidade de impulsionar o desenvolvimento do setor. O debate destacou a importância de discutir a autonomia e independência financeira das agências reguladoras para garantir a continuidade dos projetos de infraestrutura e evitar a dependência do Orçamento Geral da União.
O setor, através de suas associações, tem apoiado a necessidade de fortalecer a regulação, com o uso dos recursos da agência para investimentos em modernização e treinamentos de capacitação para os técnicos da agência. A redução de pessoal e os cortes orçamentários impactam a performance, exigindo um esforço coletivo para manter a solidariedade econômica e financeira.