Setor imobiliário brasileiro se reinventa diante de pressões macroeconômicas e avanços estruturais

Insights do Brazil GRI revelam um mercado que caminha para um futuro de maior integração entre urbanismo, tecnologia, serviços e desenvolvimento imobiliário

28 de novembro de 2025Mercado Imobiliário
Escrito por:Isabella Toledo

Resumo Executivo

O mercado imobiliário brasileiro caminha para encerrar 2025 em um dos momentos mais complexos e transformadores de sua história recente. 

Em diversos segmentos - do residencial ao logístico, passando por escritórios, shoppings, hotéis e loteamentos - o setor convive simultaneamente com desafios macroeconômicos, avanços estruturais e mudanças profundas no comportamento do consumidor. 

A combinação entre juros elevados, escassez de mão de obra, alto custo de terrenos, necessidade de maior produtividade e um ambiente regulatório em transição cria um cenário que exige eficiência, adaptação e visão estratégica. 

O novo GRI Conference Spotlight, que reúne insights compartilhados no Brazil GRI 2025, explora as principais tendências, oportunidades e frentes de atenção que moldarão o futuro do real estate brasileiro.

Principais Insights

  • Demanda resiliente, mas com forte polarização: Enquanto o residencial econômico segue impulsionado pelo Minha Casa Minha Vida e o altíssimo padrão cresce ancorado em preservação patrimonial, a classe média permanece pressionada pelo custo do capital e pelo impacto da inflação.
  • Transformações estruturais nos produtos imobiliários: Multifamily ganha força definitiva, shoppings migram para o modelo de city centers, escritórios vivem flight to quality, e a logística avança com galpões mais tecnológicos, automatizados e interiorizados.
  • Desafios regulatórios e de execução: Burocracia, insegurança jurídica (especialmente nos loteamentos), hiato de produção nos escritórios, dificuldades de financiamento para hotéis, escassez de mão de obra e gargalos nas aprovações impactam cronogramas, margens e escala.
  • Tecnologia, produtividade e integração urbana como motores do futuro: IA, automação, industrialização da construção e uso estratégico de dados se tornam centrais, enquanto empreendimentos mistos e hubs urbanos multifuncionais passam a liderar a nova lógica de desenvolvimento imobiliário no Brasil.

A evolução do segmento residencial

O mercado residencial brasileiro vive uma fase marcada por contrastes. De um lado, a demanda permanece consistente, sustentada por fatores demográficos e pela necessidade real de moradia; de outro, o cenário macroeconômico desafiador prolonga o tempo de decisão de compra e reduz a velocidade das transações. 

Enquanto o segmento econômico continua aquecido graças aos subsídios do Minha Casa, Minha Vida, o altíssimo padrão segue um ciclo próprio, impulsionado pela lógica de preservação patrimonial e pelo capital oriundo do agronegócio e do mercado financeiro.

Porém, surgem desafios estruturais. Os longos ciclos de obra e a baixa ocupação imediata deixam condomínios recém-entregues praticamente vazios por meses, o que afeta a experiência dos primeiros moradores e pressiona incorporadoras a repensarem seus modelos. 

A crescente participação de investidores que compram para revender também amplia a oferta de unidades prontas e cria concorrência direta com os próprios lançamentos, exigindo estratégias mais eficientes de diferenciação e gestão de estoque.

À medida que 2026 se aproxima - ano eleitoral e de implementação gradual da reforma tributária - o setor se prepara para um ambiente de maior complexidade. A nova estrutura fiscal deve impactar custos, margens e modelos construtivos, forçando incorporadoras a evoluírem rapidamente em gestão financeira, suprimentos e compliance tributário. 

Programas habitacionais fortalecidos

O Minha Casa Minha Vida vive um ciclo de expansão sem precedentes, impulsionado por ajustes estruturais, aumento de subsídios e maior participação dos governos estaduais e municipais. 

Com o FGTS e o fundo social fortalecidos, o programa alcança níveis recordes de contratação. A atualização dos tetos em cidades estratégicas e o reforço dos incentivos regionais demonstram o esforço para adequar o programa às diferenças geográficas e destravar gargalos históricos na produção habitacional.

Apesar dos avanços, o setor ainda enfrenta entraves. A falta de integração entre União, estados e municípios compromete a velocidade de aprovação de projetos, principalmente no interior, onde legislações díspares e exigências urbanísticas variáveis podem adicionar anos aos cronogramas. 

Esse atraso afeta custos, margens e a capacidade de escalar produção. Soma-se a isso o impacto da burocracia, a escassez de mão de obra e a urgência de avançar na industrialização da construção. Soluções inovadoras, como casas pré-fabricadas, ganham força, mas exigem revisão normativa e maior preparo técnico dos agentes locais.

À medida que o país se aproxima de 2026, o cenário se mostra favorável: fundos robustos, demanda expressiva e maior participação dos entes locais criam condições para continuidade do crescimento, mesmo em um ano eleitoral. 

As empresas, porém, atuam com seletividade rigorosa na compra de terrenos, reforçando eficiência operacional e mantendo foco nas Faixas 1 e 2 - onde a demanda é estrutural e a política de subsídios entrega maior impacto.

A expansão do residencial para renda

O mercado de residencial para renda ganhou força no Brasil e hoje se consolida como uma das teses mais relevantes do setor imobiliário. 

O que antes era visto com ceticismo, devido à combinação entre lei do inquilinato, cultura de propriedade e baixa profissionalização, transformou-se após a pandemia, impulsionado por mudanças no comportamento do consumidor e por uma nova dinâmica urbana. 

Com vacância baixa, reajustes consistentes e performance operacional superior ao mercado pulverizado, o multifamily demonstra que a gestão profissional é capaz de entregar eficiência mesmo em um ambiente de juros elevados.

A consolidação desse modelo revela uma mudança estrutural no país: o aluguel deixou de ser uma etapa transitória e passou a ocupar um papel definitivo na jornada habitacional de famílias, jovens profissionais e executivos. 

O maior desafio permanece no funding de longo prazo, já que o Brasil ainda carece de linhas estruturadas para desenvolvimento multifamily. Em resposta, operadores têm recorrido a estruturas de mercado e a parcerias com incorporadoras, visando mitigar restrições de capital. 

Mesmo assim, investidores institucionais seguem apostando no segmento, enxergando valorização no médio prazo e a alternativa de venda ao usuário final como mecanismo de saída. 

Com fundamentos sólidos - desde a dificuldade de acesso à casa própria até a urbanização acelerada - o multifamily se firma como um caminho estratégico e irreversível na transformação do mercado imobiliário brasileiro.

Desafios para loteamentos

O mercado brasileiro de loteamentos passa por um ciclo de ajuste após o período de euforia pós-pandemia, marcado por uma retração expressiva nos lançamentos, enquanto as vendas recuaram em ritmo menor - sustentadas em parte pela escassez de estoque em praças específicas.

A dinâmica regional mostra que o Brasil abriga múltiplas realidades dentro do mesmo setor. Enquanto São Paulo enfrenta saturação e valores elevados, mercados como Sul, Centro-Oeste, Norte e partes do Nordeste seguem aquecidos, impulsionados por migração, expansão industrial e maior eficiência logística local. 

O maior entrave para 2026, entretanto, não está na demanda, mas na crescente insegurança jurídica e na complexidade dos processos de aprovação. Interferências de prefeituras, Ministério Público e cartórios têm ampliado a subjetividade regulatória, resultando em contrapartidas inesperadas e atrasos substanciais nos cronogramas. 

As discussões sobre distratos voltaram ao centro do debate, agravadas por decisões divergentes no Superior Tribunal de Justiça (STJ) que impactam regras de fruição, devolução de valores e prazos de reembolso.

Para mitigar riscos, muitas empresas têm adotado a alienação fiduciária após o Termo de Verificação de Obras (TVO) como alternativa de proteção, embora esse modelo ainda gere desafios operacionais junto às instituições financeiras.

Nesse contexto, a expansão do setor dependerá diretamente da previsibilidade jurídica, da qualidade técnica dos projetos e da capacidade de diálogo com os entes municipais.

A reconfiguração dos escritórios

O mercado de escritórios brasileiro vive uma recuperação consistente, marcada pela retomada da absorção líquida nos principais polos corporativos e pela migração das empresas para ativos mais modernos, flexíveis e bem localizados. 

O movimento de flight to quality ganhou força à medida que organizações estruturaram modelos híbridos, retomaram o presencial e passaram a valorizar lajes amplas, áreas de convivência e infraestrutura robusta. 

Esse comportamento, somado à crescente escassez de grandes espaços contíguos, reacendeu a prática de pré-locação - agora firmada com até 10 meses de antecedência - algo que não era observado desde antes da crise do setor.

Apesar dos avanços, o setor enfrenta um desafio crítico: o hiato de produção. O custo elevado de reposição, a escassez de financiamento e os juros altos dificultam novos desenvolvimentos especulativos, comprimindo o pipeline e reduzindo drasticamente o estoque futuro. 

A combinação entre demanda crescente, oferta limitada e migração ao presencial tende a pressionar preços para cima e reduzir ainda mais a vacância nas regiões prime. 

Nesse cenário, o mercado corporativo demonstra resiliência e forte potencial de valorização, reforçando seu papel como um dos segmentos mais estratégicos do real estate brasileiro nos próximos anos.

A interiorização da logística

O setor industrial e logístico brasileiro vive um momento de expansão excepcional, sustentado por um ciclo de demanda intensa, baixa vacância e forte profissionalização das operações. 

A absorção líquida supera a entrega de novos galpões, os aluguéis vêm em trajetória de alta após quase uma década de estabilidade e o volume de construções em andamento atingiu seu maior patamar histórico. 

O e-commerce continua sendo o principal vetor desse dinamismo, exigindo velocidade, capilaridade e ativos cada vez mais estratégicos. Na localização, Cajamar e Guarulhos mantêm o protagonismo, enquanto Minas Gerais, Goiás, Bahia, Pernambuco e o Sul ganham relevância, consolidando uma logística nacional menos concentrada no Sudeste.

Apesar do cenário aquecido, o setor enfrenta obstáculos, como o aumento acelerado dos custos de construção, a escassez de mão de obra e processos de aprovação morosos, que exigem maior seletividade nos investimentos e pressionam a viabilidade de empreendimentos. 

A necessidade de produtividade avançada impulsiona a adoção de automação, robotização e sistemas inteligentes de armazenagem, levando desenvolvedores a entregar galpões já preparados para operações de alta densidade. 

A interiorização da logística, a chegada de players internacionais e a consolidação de novos polos fortalecem a posição do Brasil como um dos mercados mais estratégicos da América Latina. 

Entretanto, o avanço do setor dependerá da capacidade de lidar com os efeitos da reforma tributária, garantir previsibilidade regulatória e continuar investindo em tecnologia, produtividade e infraestrutura moderna. 

A revitalização dos shoppings

O setor de shoppings encerra 2025 em trajetória ascendente, mesmo diante de um contexto macroeconômico adverso. Vendas em alta, expansão de portfólios e a chegada de marcas internacionais fortalecem a posição dos shoppings como ativos resilientes e cada vez mais premium. 

A evolução do comportamento do consumidor no pós-pandemia - especialmente o aumento do consumo de luxo e a valorização de experiências - impulsiona a ressignificação do mix, com substituição de antigas âncoras por operações de serviços, wellness, clínicas, academias e entretenimento qualificado. 

A digitalização acelerada tornou-se um vetor central da competitividade dos shoppings. Aplicativos, programas de fidelidade, automação via apps como WhatsApp e ferramentas de inteligência artificial ampliam a personalização da jornada e a eficiência operacional, aproximando o setor de um modelo B2B2C orientado por dados. 

Paralelamente, cresce o foco na monetização de experiência e mídia: eventos patrocinados, ativações de marca e mídia digital já representam novas linhas de receita, mas ainda distantes do enorme potencial existente. 

A transformação mais estratégica, contudo, está na convergência entre shopping centers e desenvolvimento imobiliário. Grandes operadores avançam para modelos de “city center”, integrando torres residenciais, corporativas, centros médicos, hotéis e até bairros planejados ao entorno dos malls. 

Essa densificação gera recorrência, fortalece o fluxo diário, amplia fontes de receita e blinda os empreendimentos contra oscilações do varejo digital. À medida que o setor se aproxima do conceito global de “work, live and play” os shoppings deixam de ser apenas equipamentos comerciais para se tornarem hubs urbanos multifuncionais.

O novo ciclo da hotelaria

A hotelaria brasileira atravessa uma fase excepcional, impulsionada por desempenho operacional acima dos níveis pré-pandemia, demanda consistente e crescente interesse de investidores institucionais. 

Com diárias médias em alta, ocupação estabilizada e margens significativamente mais saudáveis, o setor voltou ao radar de grandes fundos, que enxergam previsibilidade e profissionalização cada vez maiores nas operações. 

O pipeline confirma essa força: mais de 150 novos hotéis devem ser inaugurados até 2028, majoritariamente urbanos e alinhados ao apetite de investidores por ativos verticalizados e de alto padrão. 

Marcas internacionais também ampliam presença no país, amparadas pelo consumo doméstico robusto e pela disposição crescente do brasileiro em investir em experiências premium.

Apesar do momento favorável, o financiamento continua sendo o principal gargalo. Há um forte descompasso entre o interesse por ativos prontos e a dificuldade de viabilizar novos projetos greenfield. 

A maior parte dos desenvolvimentos só avança por meio de capital próprio ou linhas incentivadas de bancos de fomento, como no Nordeste, onde custos de dívida mais baixos tornam resorts e hotéis de lazer executáveis. 

No campo operacional, desafios como mão de obra e sazonalidade convivem com oportunidades crescentes em tecnologia, automação e inteligência artificial, que já diferenciam operadores mais eficientes.

Para 2026, o setor adota um otimismo cauteloso. A ausência de novos lançamentos durante a pandemia resultou em oferta controlada, sustentando preços e margens em patamares elevados. 

O avanço dos branded residences deve intensificar a convergência entre hotelaria e real estate, criando empreendimentos mais valorizados e reforçando a presença de marcas globais. 

Caso a esperada queda de juros se confirme, o país poderá assistir a um novo ciclo de investimentos, destravando projetos represados e ampliando a participação institucional.