Investimentos seletivos, integração tecnológica e evolução do consumo ditam o rumo do novo real estate brasileiro

Resiliência dos FIIs, protagonismo do capital privado, uso de inteligência artificial e foco em experiência definem o cenário dinâmico do setor imobiliário

3 de dezembro de 2025Mercado Imobiliário
Escrito por:Isabella Toledo

Resumo Executivo

O novo real estate brasileiro é marcado pela convergência entre tecnologia, protagonismo do capital privado, novos padrões de consumo e transformação urbana. O setor passa a ser orientado por propósito, com consumidores exigindo conveniência e experiências.

Ao mesmo tempo, investimentos se redistribuem diante de juros altos, incertezas macroeconômicas, enquanto FIIs e FIAGROs se adaptam com estratégias mais sofisticadas em um ambiente de liquidez restrita. 

Principais Insights

  • O setor migra do foco no “tijolo” para um modelo orientado por propósito, impulsionado por novos padrões de consumo que valorizam conveniência, sustentabilidade e experiência.
  • Juros altos e incertezas econômicas tornam o capital mais seletivo, enquanto segmentos como data centers, multifamily e logística ganham destaque. FIIs e FIAGROs se adaptam com estratégias sofisticadas diante da liquidez restrita.
  • PPPs e políticas públicas redirecionam a oferta habitacional para modelos como locação social e retrofit; consumidores jovens aceleram a lógica do acesso, impactando mobilidade, urbanismo e design dos empreendimentos.
  • A inteligência artificial redefine processos, exigindo uso estratégico e infraestrutura robusta, enquanto o Brasil encara 2026 com necessidade de disciplina fiscal, ambiente regulatório mais transparente e projetos bem estruturados para atrair capital global.

Tradicionalmente centrado na tangibilidade do “tijolo” e na métrica do metro quadrado, o mercado imobiliário agora se adapta a um ambiente mais dinâmico e digital, incorporando automação, inteligência artificial e digitalização nos processos de construção e operação.

Além disso, a crescente valorização do propósito no setor imobiliário tem levado a uma demanda por projetos que vão além das necessidades de moradia, oferecendo conveniência, qualidade de vida e sustentabilidade. 

Ao mesmo tempo, a profissionalização do mercado tem sido essencial para garantir um crescimento sustentável. A diversificação dos produtos imobiliários, como imóveis para locação, e a adaptação a modelos mais flexíveis estão se destacando, mesmo diante do cenário econômico desafiador.

O capital privado tem ganhado protagonismo, com uma clara redução da participação do funding público e uma aceleração da desbancarização, enquanto o mercado de fundos imobiliários (FIIs) tem se fortalecido, com maior demanda por ativos de longo prazo e soluções mais eficientes. 

O novo GRI Conference Spotlight, que reúne insights compartilhados no Brazil GRI 2025, explora o futuro do setor, que aponta para a integração de propósito e performance financeira, com um foco crescente em sustentabilidade, experiência do usuário e inovação tecnológica como elementos-chave para o sucesso.

Juros altos tornam capital mais seletivo

Enquanto setores como escritórios, galpões logísticos e multifamily mostram uma resiliência notável, superando as expectativas de absorção e locação, o cenário macroeconômico permanece desafiador, com altas taxas de juros que comprimem os resultados das operações alavancadas e exigem retornos mais elevados para novos investimentos.

Essa complexidade reflete-se na dinâmica de atração de capital. Investidores estrangeiros demonstram receio em relação à falta de previsibilidade no Brasil, apesar do capital asiático ter se reaproximado, impulsionado por fatores geopolíticos, com foco principal em infraestrutura e energia. 

A liquidez do mercado tem dependido de fundos locais e do investidor de varejo, que frequentemente compara o retorno imobiliário ao CDI (Certificado de Depósito Interbancário), o que dificulta a captação de recursos para projetos de longo prazo, especialmente fora dos grandes centros.

A expansão para outras regiões, como o Centro-Oeste e o Norte, mostra-se promissora, mas é um desafio estrutural para as empresas, que precisam avaliar cuidadosamente a viabilidade e o potencial de retorno desses investimentos.

Olhando para o futuro, as oportunidades de investimento se refinam, com destaque para o segmento de data centers e o setor de "living", que inclui residencial para renda, student housing e multifamily.

Gestão ativa define resiliência de FIIs

O mercado de Fundos Imobiliários (FIIs) no Brasil atravessa um período de ajustes. A captação de novos recursos via ofertas primárias tem se tornado mais restrita, especialmente para os fundos de “tijolo”, mas a indústria tem demonstrado criatividade e resiliência.

Para lidar com a escassez de liquidez, gestores têm adotado estratégias como reciclagem de portfólio, permuta de ativos por cotas e operações de crédito mais sofisticadas, como tranches seniores e subordinadas, para atrair diferentes perfis de risco.

Embora o ambiente de juros elevados continue sendo o principal obstáculo para a expansão dos fundos de tijolo, essa distorção de preços abre oportunidades para aquisições estratégicas e consolidações. 

O custo de reposição dos ativos ainda é elevado, e a produção de novos estoques, especialmente em lajes corporativas, tem sido limitada, o que gera uma janela de oportunidade para novos investimentos. 

Com a crescente sofisticação dos FIIs, a indústria segue explorando teses além do convencional, incluindo desenvolvimentos residenciais, shopping centers, infraestrutura logística e data centers, enquanto trabalha para atrair novos investidores, como family offices, que buscam maior eficiência tributária, liquidez e gestão profissional.

Potencial de FIAGROs ainda é subexplorado

O agronegócio brasileiro segue sendo um dos pilares da economia nacional, representando cerca de 30% do PIB. No entanto, quando se observa sua participação no mercado de capitais, especialmente nos Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (FIAGRO), nota-se um descompasso significativo.

Com aproximadamente quatro anos de operação e um patrimônio estimado em 20 bilhões de reais, a indústria de FIAGROs ainda é consideravelmente menor que os Fundos Imobiliários (FIIs), refletindo um mercado que ainda não atingiu seu pleno potencial. 

A taxa de juros elevada, somada a uma crise de confiança recente e a ajustes nos preços das commodities, tem sido um desafio, afetando tanto a origem de novas operações quanto a gestão das dívidas existentes.

Apesar desses obstáculos, o Brasil continua se destacando como um player essencial na produção global de alimentos. A evolução das teses de investimento está em andamento, com os Fundos de Terra ganhando destaque e um forte apetite de investidores institucionais e estrangeiros por ativos reais, atraídos pelos retornos financeiros e pela relevância estratégica da segurança alimentar.

O futuro do mercado de FIAGROs depende da capacidade de estruturar veículos de investimento com maior escala, superando os desafios dos fundos pequenos e pulverizados predominantes atualmente.

Para atrair capital soberano e internacional, será necessário criar modelos de investimento mais robustos, alinhados com as crescentes necessidades de segurança alimentar e o crescimento do setor agroindustrial.

PPPs avançam em modelos de locação e retrofit

As parcerias público-privadas (PPPs) e concessões no Brasil estão passando por uma expansão para setores estratégicos do mercado imobiliário e da infraestrutura social, refletindo uma reconfiguração na gestão de ativos públicos e no enfrentamento do déficit habitacional. 

O modelo tradicional, focado quase exclusivamente na alienação e propriedade da moradia, começa a ceder espaço para a locação social, alinhando o Brasil a práticas internacionais consolidadas. 

O objetivo central é garantir o acesso à moradia de qualidade em regiões centrais, evitando a revenda do ativo e assegurando que o benefício social permaneça com as famílias que mais necessitam.

Além disso, o uso de subvenção econômica para requalificação urbana, como o retrofit de imóveis e a desapropriação de áreas ociosas, tem sido essencial para aumentar a oferta de moradia e revitalizar regiões degradadas, estimulando investimentos e criando soluções habitacionais mais acessíveis.

Experiência e flexibilidade definem novo consumidor

A entrada de novas gerações no mercado de trabalho e no centro das decisões de consumo tem acelerado uma mudança estrutural nas estratégias corporativas. 

Trata-se de uma transformação de mentalidade marcada pelo imediatismo, pela busca por propósito e por expectativas cada vez mais elevadas em relação à qualidade de vida.

No setor de construção e real estate, esse movimento é especialmente desafiador devido ao envelhecimento da força de trabalho - jovens têm preferido a flexibilidade da economia informal à rigidez dos canteiros de obra. 

No campo do consumo, o bem-estar e a sustentabilidade tornaram-se requisitos centrais, influenciando diretamente o padrão dos novos empreendimentos imobiliários. Áreas completas de wellness, quadras esportivas e lockers para entregas online já são considerados itens obrigatórios em projetos residenciais  de médio e alto padrão.

A lógica da posse está sendo substituída pela lógica do acesso, impulsionando a economia compartilhada e transformando mobilidade e urbanismo. Modelos de assinatura para veículos e empreendimentos sem garagem tradicional refletem um consumidor que prioriza conveniência, conectividade e praticidade. 

Ao mesmo tempo, a comunicação das marcas precisa se adaptar a um ambiente omnichannel, enquanto espaços físicos - como shoppings - assumem o papel de plataformas de mídia e socialização, com experiências “instagramáveis” e estratégias de engajamento baseadas em gamificação.

Nesse contexto, o recado para as empresas é claro: não basta entregar um produto ou serviço, é preciso oferecer um propósito autêntico, capaz de conectar valores pessoais aos valores da marca.

Revolução tecnológica chega ao real estate

A inteligência artificial vem redefinindo o mercado imobiliário e exige que as empresas adotem essa tecnologia com clareza estratégica, identificando problemas reais a serem solucionados e métricas que orientem sua aplicação. 

A IA deve ser vista como uma ferramenta de produtividade, capaz de ampliar resultados ou reduzir custos operacionais, e não como uma resposta impulsiva à pressão competitiva.

No setor imobiliário, a transição para a era dos agentes de IA - assistentes digitais capazes de aprender preferências, executar tarefas complexas e interagir entre si - transformará desde a busca por imóveis até a condução de negociações. 

Ainda assim, o futuro será híbrido: a inteligência humana continuará indispensável em decisões de alto valor emocional, como a compra de um imóvel, enquanto a IA ampliará a capacidade dos profissionais ao automatizar tarefas repetitivas. 

Tecnologias de “IA física” também começam a remodelar segurança, varejo e atendimento presencial, como o uso de visão computacional e câmeras com sensores inteligentes capazes de identificar comportamentos, padrões e riscos em tempo real.

Esse avanço intensifica o debate sobre privacidade e uso ético das informações, especialmente em cidades inteligentes e empreendimentos residenciais, ao mesmo tempo que cria novas demandas de infraestrutura, como a necessidade de mini data centers integrados aos empreendimentos para garantir o alto desempenho das aplicações. 

Otimismo cauteloso é o lema para 2026

À medida que 2026 se aproxima, o ambiente econômico brasileiro exige cautela e preparo para a volatilidade. O fechamento de 2025 traz um cenário global mais favorável do que se imaginava, com os Estados Unidos iniciando cortes de juros e reduzindo o risco de recessão, o que tende a reorientar capital para mercados emergentes. 

O desafio fiscal permanece no centro das preocupações, com incertezas sobre a sustentabilidade do arcabouço fiscal e pressão por gastos em um ano eleitoral que promete oscilações relevantes em ativos, câmbio e juros.

Ao mesmo tempo, forças estruturais globais - como a digitalização e a ascensão da inteligência artificial como tese de infraestrutura - impulsionam a necessidade de investimentos robustos em energia, utilities e data centers. Para capturar esse movimento, o Brasil precisará de um ambiente regulatório mais transparente, que reduza ineficiências e facilite o fluxo de capital local e internacional.

A maior transformação para o mercado imobiliário está na estrutura de funding. A queda acelerada da poupança, intensificada pelo avanço do Open Finance, evidenciou sua ineficiência e abriu espaço para o mercado de capitais assumir protagonismo. 

Operações estruturadas, securitizações e prazos mais longos tornam-se essenciais em um momento em que bancos reduzem a oferta de crédito, enquanto medidas regulatórias recentes oferecem alívio temporário.

A atração de capital estrangeiro, por sua vez, requer uma abordagem mais alinhada às práticas internacionais. Investidores globais buscam parceiros especializados e projetos bem estruturados, mas enfrentam barreiras como o alto custo do hedge cambial. 

Superar esse entrave depende de maior maturidade em planejamento, com a preparação de projetos com matrizes de risco e retorno adequadas antes de ir ao mercado. Assim, o Brasil poderá se posicionar de forma mais competitiva na disputa global por investimentos em infraestrutura e real estate.