Radar de mercado: Nova tributação pode virar o jogo do crédito habitacional

Leia mais sobre os efeitos da MP no setor, o dilema da tokenização imobiliária, e as discussões sobre ajustes no MCMV

26 de setembro de 2025Mercado Imobiliário
por Isabella Toledo

A Medida Provisória 1.303, que reorganiza a tributação de investimentos, tende a redesenhar o funding do mercado imobiliário. O ponto mais sensível é a cobrança de 7,5% sobre os rendimentos de LCI (Letra de Crédito Imobiliário), LCA (Letra de Crédito do Agronegócio) e LIG (Letra Imobiliária Garantida), hoje isentos.

A Abecip e grandes players do mercado alertam que a medida reduz a atratividade das LCIs, elevando o custo de captação das instituições financeiras. Como as LCIs se tornaram uma fonte crucial de recursos após a retração da poupança, parte desse custo tende a ser repassada, pressionando as taxas e encarecendo o crédito habitacional para o consumidor final.

No mercado de capitais, o parecer preserva a isenção para CRI (Certificado de Recebíveis Imobiliários), CRA (Certificado de Recebíveis do Agronegócio) e debêntures incentivadas, abrindo espaço para realocação de fluxo e fortalecimento de operações estruturadas — desde que lastros, garantias e governança sustentem a demanda.

Para FIIs (Fundos de Investimento Imobiliário) e Fiagro (Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas do Agronegócio), mantém-se a isenção de rendimentos para pessoa física (mediante requisitos) e fixa-se 17,5% sobre ganhos de capital, mas a migração para o regime de competência pode alterar calendário e previsibilidade de distribuições em alguns fundos.

A MP cria uma dualidade: pressiona o custo do financiamento à moradia ao onerar o funding via LCI, enquanto preserva a atratividade de instrumentos alternativos como CRI, CRA e FIIs. O mercado, contudo, critica a ausência de debate mais aprofundado para mudanças com impactos estruturais sobre o acesso ao crédito e a atividade econômica.

Disputa regulatória marca avanço da tokenização imobiliária no Brasil

A tokenização imobiliária - fracionamento de imóveis em tokens via blockchain - ganhou fôlego como forma de ampliar liquidez e acesso a investimentos, mas expôs um conflito de competências. 

Após o Conselho Federal de Corretores de Imóveis (Cofeci) publicar resolução reconhecendo a prática no âmbito da intermediação, o Operador Nacional do Registro Eletrônico de Imóveis (ONR) solicitou ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) uma norma específica.

Para o ONR, direitos de propriedade não podem ser tokenizados sem base legal clara, uma vez que a titularidade permanece na matrícula; já ofertas atreladas a recebíveis seguem sob supervisão da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O Cofeci, por sua vez, sustenta que sua atuação não altera a natureza jurídica dos contratos nem substitui o registro público.

No centro do debate estão segurança jurídica, interoperabilidade com o sistema registral e proteção ao investidor. A avaliação predominante é que a tecnologia pode avançar mediante um marco regulatório coordenado entre os órgãos, para que a tokenização escale com previsibilidade, transparência e mitigação de riscos.

É hora de revisar as faixas do Minha Casa Minha Vida?

O mercado imobiliário articula ajustes no Minha Casa, Minha Vida (MCMV) para recuperar fôlego nas vendas e ampliar o alcance à classe média. Incorporadoras levaram ao governo federal a proposta de elevar o teto de preço da Faixa 4 de R$ 500 mil para R$ 650 mil e a renda elegível de R$ 12 mil para R$ 15 mil, argumento ancorado no uso mais eficiente dos recursos e na necessidade de destravar a demanda nesse segmento.

Os números, por ora, mostram tração aquém do esperado. Entre maio e agosto, a Faixa 4 consumiu R$ 2,8 bilhões, 9,3% do orçamento anual de R$ 30 bilhões, reflexo de oferta limitada de produtos enquadráveis e da opção de parte das empresas por reduzir metragens e focar faixas de renda mais baixas (1 a 3). 

Do lado das incorporadoras, cresce a defesa de um ajuste mais amplo. Para o CEO da MRV, Eduardo Fischer, “já é hora” de atualizar os tetos de preço e limites de renda das três primeiras faixas, defasados após o ciclo inflacionário recente. 

Fischer destaca que a previsibilidade do funding é determinante para a continuidade do ciclo: enquanto o programa se apoia tradicionalmente no FGTS, a Faixa 4 foi viabilizada pelo Fundo Social do Pré-sal, com nova injeção prevista para 2026, e o setor pleiteia recorrência desses recursos para sustentar o pipeline de longo prazo.

Apesar das incertezas, grandes lançamentos no MCMV seguem no radar. A MRV anunciou em São José dos Campos (SP) a “Cidade Sete Sóis Vistas do Vale”, empreendimento de R$ 1 bilhão, 440 mil m² e capacidade para 16 mil moradores, com conclusão prevista até 2034.